De quantos anos de cursinho você precisa para ar no vestibular de medicina? 683339
· Três
vestibulandos que estão há pelo menos três anos tentando uma vaga em medicina
contam como se preparam e como se mantêm motivados na disputa pela carreira.
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ar direto
do ensino médio para um curso de medicina não é impossível, mas as estatísticas
mostram que apenas uma minoria dos candidatos consegue a aprovação no
vestibular na primeira tentativa. Na Universidade de São Paulo, eles
representam menos de 10% do total de calouros da medicina na Capital. Enquanto
na média total de mais de dez mil calouros de 2016 mostrava que 22,9% tinham 17
anos na véspera da segunda fase da Fuvest, entre os aprovados em medicina esse
número cai para 9,1%.
Além disso, 53%
dos aprovados no curso naquele ano afirmaram que precisaram de pelo menos dois
anos de cursinho antes de conquistar a vaga.
A
estudante Teresa Leite, de 20 anos, precisou de
quatro tentativas "a sério", sem contar a experiência
de treineira, para se tornar graduanda em medicina. Atualmente, ela está no
primeiro ano do curso da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa, depois de
ter sido aprovada pela Fuvest 2017. De acordo com ela, "o emocional tem que
estar bem forte para lidar com toda essa pressão".
A situação
ainda é diferente para três vestibulandos de Alagoas, Rio de Janeiro e São
Paulo ouvidos pelo G1. Além de se
apegarem à vocação pela carreira, eles dizem que a perspectiva da disputa
ferrenha por uma vaga em medicina – especialmente em uma universidade pública –
exige dos candidatos planejamento, força de vontade, concentração e apoio da
família. Veja a história de cada um deles:
Júlia
Visconti, 24 anos, Rio de Janeiro
Filha de
militar, a estudante carioca cresceu em Brasília e neste ano voltou com a
família para a capital fluminense. Atualmente, ela estuda no curso
pré-vestibular De A a Z, na Barra da Tijuca. Antes, porém, ela já havia feito
cinco anos de cursinho em Brasília, e seu objetivo principal é conseguir uma
vaga na Escola Superior de Ciências da Saúde, que é ligada ao governo do
Distrito Federal e aderiu ao Sistema de Seleção Unificada (Sisu). Ela diz que
já foi aprovada em três faculdades particulares, mas sua família não tem como pagar
as mensalidades. Segundo Júlia, se for aprovada em alguma universidade pública,
ela desiste de sua primeira opção.
Por que decidiu estudar medicina"Como dizem meus pais, eu decidi com um ano de
idade. É a única coisa que eu consigo pensar em fazer. Já pensei em todos os
cursos, direito, nutrição. Eu não quero ter consultório, não quero ser
dermatologista. Quero trabalhar em hospital de bairro, hospital geral. Tenho
dúvidas, mas a gente muda depois. Mas atualmente ou ser oncologista ou alguma
coisa que trabalhasse com criança."
Há quantos anos tenta o vestibular de medicina? "É o sexto ano de cursinho. A minha mãe
e meus irmãos me apoiam muito. Meu pai foi uma jornada, no início, ele não
concordava, tinha briga. Mas depois que ele viu que todos os filhos dos amigos
dele fazem particular, ele viu que federal não era uma coisa tão fácil, então
hoje em dia ele entende. Minha mãe acha que não devo desistir de jeito
nenhum."
Como se prepara para o vestibular? "Acordo cedo, mas não absurdamente cedo, como já fiz.
Antigamente dormia cinco horas por noite, estudava quase 20 horas por dia. Hoje
acordo às 7h30 ou 8h, estudo até 12h, 13h. Almoço, faço exercício [físico] e
venho para o curso. Tenho aula das 15h50 até 20h40. Vou para casa e durmo. No
fim de semana estudo também. Como tenho dificuldade em redação, estou fazendo
aula com um professor que dizem que é um dos melhores do Rio. Estou seguindo as
dicas dele, fazendo uma redação por semana. Daqui a pouco vou começar a fazer
duas. Ele nem acha necessário, mas vou fazer."
Como mantém a motivação para estudar? "Eu nem ei ainda, mas acho que vale [a pena se dedicar
durante vários anos]. A gente não está fazendo nada errado, está estudando pra
ar em uma federal. Se você realmente tem vocação para medicina, como eu,
não tem por que desistir. Calma eu não mantenho, não. Isso me atrapalha muito.
Já fiz psicóloga, e eu tento manter a calma, mas não sei como. A motivação é a
vocação mesmo, tentar não pensar em outras coisas. É o querer. Sei que é o que
eu quero para a minha vida, e que diferença faz me formar com 24 ou com 30? É
medicina."

Arlyson
Souto, 20 anos, Maceió
Este é o
terceiro ano em que Arlyson se dedica integralmente a conseguir uma vaga em um
curso de graduação em medicina. O estudante do Curso Contato, da capital
alagoana, vive com a mãe e com a avó e conta com o apoio da família e da
namorada no seu plano. Ele diz que começou o cursinho sabendo que levaria pelo
menos três anos para conseguir se preparar de forma adequada para o vestibular.
Por que decidiu estudar medicina? "Eu não tinha nenhum vínculo com esse tipo de coisa, mas
minha mãe me indicou, disse que era um bom curso. Tenho irmão farmacêutico,
irmã enfermeira, dois tios médicos, tio dentista, que me aconselharam, me
disseram os prós e contras. Tinha certa dúvida entre medicina e física, mas
alguns acontecimentos me fizeram abraçar esse tipo de causa, então hoje eu
abordo isso como única opção. Não vejo nenhuma solução plausível para
substituir esse curso."
Há quantos anos tenta o vestibular de medicina? "Três. Quando escolhi eu tinha 17 anos,
estava terminando o ensino médio. Só que nessa época, por questão de
maturidade, eu não tinha aquela certeza absoluta. Como terminei o terceiro ano
um pouco com falta de qualidade, de ensino, de busca, de objetivo, de
estrutura, comecei a ter base [do ensino médio] no pré-vestibular. ei um
ano com base, no outro ano tempo integral, na tentativa de acumular teoria. Esse
ano tenho uma política de prática, de resolução de questões, para ver se tenho
programa completo."
Como se prepara para o vestibular? "Tenho uma estratégia de resoluções de questões, e análise
das provas do Enem. Quando fiz a prova no terceiro ano, tirei 640 pontos na
média. Em 2015, tirei 690, em 2016, 750. Minha primeira redação teve nota 680,
a segunda foi 860 e a terceira foi 980 pontos. Estudo oito horas em casa e seis
horas de aula. Faço uma redação no sábado, outra no domingo, acompanho um curso
on-line de física no sábado, no domingo resolvo questões desse curso. A família
para mim serve como o principal pilar desse processo. Ela tenta o máximo
possível não perturbar minha rotina, nada que me atrapalhe. Tenho espaço
próprio [de estudos], um quarto sem cama. A gente tirou tudo, só tem uma mesa,
duas estantes cheias de livros, o rack de computador."
Como mantém a motivação para estudar? "Eu procuro não pensar nos anos que eu fiz como tempo
perdido, como dias jogados fora. Penso como experiência adquirida. É um
processo em construção, não é uma coisa que acontece da noite pro dia, de um
ano para o outro. Foi um plano montado desde o começo, com um ano de tentativa,
e possivelmente três anos estudando. É um processo que se soma a cada dia,
precisa de uma meta a longo prazo. Para que isso aconteça, na minha opinião, o
apoio da família é fundamental."
Rodrigo
Seiji Yasue, 22 anos, São Paulo
Paulistano,
Rodrigo diz não ter parentes próximos na área de medicina. Atualmente, ele faz
curso pré-vestibular em tempo integral no Etapa, em São Paulo. Ele tem aulas
durante pelo menos nova horas todos os dias, mas estuda mais de doze horas por
dia, durante seis dias na semana.
Por que decidiu estudar medicina"Decidi com 15 anos. Pensei em engenharia
química, mas a área de medicina acho bem mais completas e interessante.
Medicina é uma carreira que me interessou logo que vi. Tanto pela matéria que
estuda quanto pelo lado humano. Eu escolhi medicina porque eu percebi que
poderia de alguma forma ajudar, curar ou amenizar a dor de outra pessoa. Também
escolhi porque engloba as matérias de que eu mais gostava no colégio: química,
física e biologia. E com o contato com amigos e parentes de amigos (médicos e
estudantes de medicina), fui percebendo que ser médico vai além do tratamento
convencional. Médico muitas vezes é uma pessoa com quem simplesmente conversar.
E essa vontade de poder fazer algo só aumentou quando vi meu avô falecer na
minha frente. Desse momento em diante eu prometi cuidar de cada paciente como
se fosse da minha família."
Há quantos anos tenta o vestibular de medicina? "Estou tentando há seis anos. Na
verdade, cinco. O primeiro ano não conta. Minha escola tinha um sistema de
ensino bom, só que eu não soube aproveitar o que deveria para essa carreira. Eu
achava que era mais fácil do que na verdade é. E aí no cursinho eu tive aquele
baque: nossa, realmente é difícil ar em medicina."
Como se prepara para o vestibular? "Acordo às 4h30 da manhã, chego no cursinho umas 6h, 6h30,
6h40, por aí. Lá tenho aula até as 16h, mas tem dia que é até as 19h da noite.
Fico no cursinho da hora que eu chego até umas 21h. E aí vou para casa, durmo
às 23h e acordo às 4h30 de novo, de segunda a sábado. No primeiro ano de
cursinho fiquei tentando ver tudo o que eu podia, todas as matérias. Aí,
ado o vestibular e a segunda fase, fui focando naquilo que fui errando.
'Não ei por quê? Por tal coisa que errei.' Aí nos anos seguintes eu fui
arrumando isso. A cada ano que a fico mais preparado e mais confiante, só
que na hora da prova bate aquele nervosismo, e você acaba não rendendo o quanto
você esperava no resto do ano."
Como mantém a motivação para estudar? "Você fica imaginando seu nome na lista, e aí isso te dá uma
força pra aguentar essa rotina. Essa rotina é bem difícil, você precisa abrir
mão de muita coisa, como viajar, sair com amigos... Só restam os domingos e
olhe lá. Mas, quando se tem um objetivo, mesmo que não seja fácil, é preciso
batalhar por ele. Minha família e meus amigos são a minha base e me apoiam
muito. Eu me esforço por mim e por eles, que estão se esforçando e torcendo
muito pelo meu sucesso."
*Colaboraram Andressa Gonçalves e Patrícia Albuquerque, no Rio de
Janeiro, e Tatiana Regadas, em São Paulo
GUIA DE CARREIRAS: MEDICINA